A HISTÓRIA DA ALIMENTAÇÃO
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Há hoje uma obsessão pela história da mesa, fazendo com que a gastronomia saia da cozinha e passe a ser objeto de estudo com a devida atenção ao imaginário, ao simbólico, às representações e às diversas formas de sociabilidade ativa. Nesse sentido, a questão da alimentação deve se situar no centro das atenções dos historiadores e de reflexões sobre a evolução da sociedade, pois a História é a disciplina que oferece um suporte fundamental e projeta perspectivas.

As cozinhas locais, regionais, nacionais e internacionais são produtos da miscigenação cultural, fazendo com que as culinárias revelem vestígios das trocas culturais. Hoje os estudos sobre a comida e a alimentação invadem as ciências humanas, a partir da premissa que a formação do gosto alimentar não se dá, exclusivamente, pelo seu aspecto nutricional, biológico. O alimento constitui uma categoria histórica, pois os padrões de permanência e mudanças dos hábitos e práticas alimentares têm referências na própria dinâmica social. Os alimentos não são somente alimentos. Alimentar-se é um ato nutricional, comer é um ato social, pois constitui atitudes, ligadas aos usos, costumes, protocolos, condutas e situações. Nenhum alimento que entra em nossas bocas é neutro. A historicidade da sensibilidade gastronômica explica e é explicada pelas manifestações culturais e sociais, como espelho de uma época e que marcaram uma época. Nesse sentido, o que se come é tão importante quanto quando se come, onde se come, como se come e com quem se come. Enfim, este é lugar da alimentação na História.

Foi com F. Braudel, herdeiro de Febvre e Bloch, através dos conceitos de cultura material, que a História da Alimentação ganha fisionomia definitiva no campo da pesquisa histórica. Inspirado nos textos de Lucien Febvre sobre a distribuição regional das gorduras e nos fundos de cozinha, Braudel, como o maior representante da 2ª. geração dos Annales, trabalhou o conceito de cultura material abrangendo os aspectos mais imediatos da sobrevivência humana: a comida, a habitação e o vestuário.
Em 1974, o lançamento de uma coletânea “Faire de l’Histoire”, traduzida no Brasil como “História: Novos Problemas, Novas Abordagens, Novos Objetos”, trouxe à tona novos paradigmas da História. Na apresentação desta coletânea, seus organizadores Jacques Le Goff e Pierre Nora reivindicavam para a Nova História “a coexistência de vários tipos de história igualmente válidos”, e defendiam o fatiamento da história, mais tarde denominada de micro-história, em contraposição a uma história absoluta do passado. A partir daí, historiadores como Jean Paul Aron e Jean Louis Flandrin deslocaram o foco da história em migalhas para o comer e para aquele que come. Através destes novos paradigmas, os ensinamentos dos Annales era para que a comida fosse levada a sério pelos historiadores.

A história oferece nos domínios da alimentação uma contribuição fundamental das perspectivas sobre o futuro. Os estudos de longa duração entre o meio e a sociedade, tendo o passado como espelho, contribuem de maneira substancial para propor os elementos e as respostas aos problemas contemporâneos que envolvem a alimentação. Indispensável à uma melhor compreensão do presente, a história mostra em quais termos são propostas - ao longo do tempo e pelo mundo todo – as questões relacionadas como aquelas da subsistência e da saúde, da segurança e dos medos, das proibições e dos gostos alimentícios, e das sensibilidades alimentares.

Do exposto, verifica-se que no cruzamento do biológico com o histórico e cultural, do social e do político, da economia e das tecnologias, emergem os marcos que permitem fazer através da comida uma reflexão sobre o próprio significado e evolução da sociedade.



Universidade Federal do Paraná - História da Alimentação